A edição do genoma tem sido o sonho de muitos cientistas em todo o mundo, que desde a divulgação da criação da ferramenta de edição genética CRISPR-Cas9 em 2016, sentiram que este desejo poderia estar muito mais próximo da realidade.
Hoje, apenas um ano depois de conhecer a ferramenta edição genética, a revista científica Nature publica o primeiro caso de edição genética humana em embriões que conseguiu corrigir a alteração congênita responsável pela miocardiopatia hipertrófica, uma doença gerada por uma alteração no gene MYBPC3 que afeta uma de cada 500 pessoas e é a causa mais comum de morte súbita de atletas.
No experimento realizado através de uma equipe internacional* composta por instituições do Estados Unidos, Korea e China, os embriões editados com sucesso foram destruídos após poucos dias de observação, pois o objetivo da pesquisa foi apenas provar a possibilidade de realizar a edição de um gene sem produzir outros erros no código genético.
Por que a edição genética é uma boa notícia?
Na história humana os passos mais marcantes da ciência com frequência causam choque e precisam ser minuciosamente estudados antes de colocados em prática. Foi assim quando pela primeira vez foi a anunciada que a transfusão de sangue poderia salvar vidas ou que o transplante de órgãos de pessoas falecidas poderia funcionar no corpo de outra pessoa.
Hoje em dia estes procedimentos são realizados e aceitos socialmente, mas houve um passado conflitivo para aceitar e provar a segurança destes e também de outros procedimentos que hoje permitem a cura de doenças e qualidade de vida.
Existem mais de 10.000 alterações monogênicas que afetam milhões de pessoas a nível mundial. Entre elas, existem as mutações autonômicas dominantes, que são alterações gênicas onde uma única cópia do gene alterado herdada do pai ou da mãe é suficiente para desencadear sintomas e patologias sem cura. Exemplos conhecidos são as alterações nos genes BRCA1 e BRCA2, famosos por estarem ligados a um alto risco de desenvolvimento de câncer de mama e de ovário hereditário e também a mutação MYBPC3, que pode levar a uma falha no funcionamento do coração.
Não foi exatamente a primeira edição embrionária, mas sim a mais prometedora
Existiram publicações anteriores sobre a edição genética em embriões humanos, no entanto, esta se destaca por ter utilizado uma metodologia diferente, mais efetiva e segura conforme declarado pelo pesquisador Izpisúa, que faz parte da equipe que publicou o artigo e, que eu tive o prazer em ouvir na última edição do PGDIS em Valência.
Os cientistas utilizaram duas formas para realizar a edição genética. Uma forma foi realizar a edição depois da fecundação e outra, antes da fecundação, ou seja, no esperma e óvulo. O segundo protocolo, aplicado aos gametas, foi o que apresentou resultados mais prometedores.
Depois da edição realizada pelo CRISPR Cas9, o embrião fez suas próprias adaptações e, em lugar de utilizar o DNA sintético proporcionado, utilizou a cópia saudável da mãe para dar continuidade ao seu desenvolvimento. Um comportamento inesperado, mas muito positivo. No final do estudo, 72% dos embriões portavam cópias saudáveis do gene em questão.
Precaução, muita precaução na edição genética
Na Igenomix estamos muito animados com possibilidade de um dia poder ir além do que fazemos atualmente, que é identificar alterações cromossômicas e genéticas que podem gerar doenças ou que não são compatíveis com a vida. Em um cenário seguro para a edição genética, muitos embriões que atualmente deixam de ser transferidos ao útero materno devido aos diversos riscos envolvidos, poderiam ser reparados para serem implantados e assim, permitir o sucesso da Fertilização in Vitro com o nascimento de um bebê saudável.
A notícia da possibilidade de edição genética humana mexeu e dividiu a sociedade entre a esperança da cura de doenças genéticas e o medo do seu uso indevido para criar versões “melhoradas” do ser humano. Definir e seguir os limites da ética é um assunto de todos. Devemos evitar o mal uso de boas técnicas com normas e controles definidos, mas não impedir o desenvolvimento de uma solução médica que pode ser a cura de milhares de doenças genéticas.