A entrevista do geneticista e químico estadunidense George Church ao New England Journal of Medicine, titulada “Razões para reparar o Genoma humano” me pareceu ser um ótimo conteúdo para inspirar o post de conclusão de mais um ano de avanços revolucionários na genética médica e refletir sobre o que vem pela frente.
A genética avança abrindo novos caminhos, o que deve ser realizado com muito cuidado como tudo que envolve vidas, mas pelo bem da saúde, precisa ser feito. O objetivo do avanço das pesquisas na área de saúde é salvar vidas, assim como é o das pesquisas na área de edição genética; salvar vidas e inclusive futuras vidas!
Prevenir o sofrimento de uma pessoa e estar um passo à frente da doença é uma das possibilidades da edição genética. Por exemplo, uma combinação de um espermatozoide afetado por uma doença dominante com um óvulo saudável tem 50% de chances de gerar um embrião afetado, mas com o uso do CRISPR-Cas9 a possibilidade de saúde do embrião poderia subir para 72%.1
Dentro de um laboratório de genética especializado em reprodução humana, identificamos embriões com alterações que podem não apenas gerar doenças graves, mas também embriões sem chance alguma de gerar um bebê nascido vivo e saudável. Se avançamos com a edição genética um dia será possível tratar estes embriões!
Como será o futuro da edição genética?
George Church comenta em sua entrevista que se estamos preocupados com relação à vida do embrião, o mundo ideal seria alcançar a taxa de 100% de embriões não afetados por doenças genéticas. Algo que nas pesquisas realizadas atualmente, tem sido conseguido com mais efetividade através das técnicas de clonagem de células-tronco2 que nas ações diretas nos embriões, pois a utilização de células-tronco clonadas está evitando erros como por exemplo, mutações espontâneas, aneuploidias cromossômicas e erros epigenéticos.
Outra opção, seguindo o caso específico do estudo do grupo da Dra Mitalipov – citado no artigo que faço no primeiro parágrafo deste post – depende de estratégias para solucionar os atuais problemas da edição genética com a ferramenta CRISPR, que tende a continuar cortando o genoma até uma mutação maior interromper este processo. Recentemente foi publicado na revista Cell exemplos de avanço na evolução da técnica CRISPR.
Uma terceira alternativa, é reduzir o risco de gerar embriões afetados atuando antes da fertilização do esperma.3 O avanço da tecnologia de sequenciamento de nova geração em conjunto com a fertilização in vitro já permitem identificar os embriões saudáveis, mas ainda não dá uma solução para os embriões inviáveis. Por isso, tratar os gametas parece ser um caminho que vale a pena investir.
Assim como os tratamentos com uso de medicamentos, as regras para os tratamentos de edição genética seguem o mesmo protocolo de segurança para a saúde: Após superar com sucesso os estágios de uma rigorosa investigação científica e serem aprovados para aplicação clínica, os procedimentos que fazem uso da edição genética devem ser acompanhados a longo prazo e de forma multigeneracional.
Razão ou medo ao desconhecido para a edição genética?
“Diante do desconhecido toda precaução é pouca”, é uma afirmação diferente de “diante de desconhecido temos que desistir!” Dr George em sua entrevista pontua bem o fato do relatório da National Academies of Sciences, Engineering, and Medicine (NASEM) estabelecer que pesquisas e testes de edição do genoma devem ser permitidos apenas quando não implicam em uma modificação genética hereditária, enquanto tal recomendação ignora que na prática atual de tratamentos quimioterápicos se modifica genes humanos em futuros pais e inclusive a saúde reprodutiva do paciente. Em sua entrevista ele provoca “Essas mutações germinais aleatórias são realmente mais aceitáveis do que a restauração cuidadosa de um estado normal verificado?”
Não poderia concluir este artigo melhor do que concluiu Geoge Church sua entrevista, por isso cito a conclusão dele:
“Incluímos entre as razões para a edição genética as doenças que afetam os embriões, a infertilidade de adultos e o declínio cognitivo da população de anciões. Quando falamos em restaurar a saúde, deveríamos estar regulando as terapias com base em resultados médicos, em vez de hipóteses, assim como devemos avaliar os funcionários com base em seu desempenho real, em vez de deixar-se levar por preconceitos. À medida que reduzimos o custo e melhoramos a qualidade da edição do DNA, é fundamental que existam discussões e ampla educação sobre esse tema. É importante proteger-se contra a manipulação comercial de necessidades médicas, mas não a custo de prevenir o desenvolvimento e uso de toda uma categoria de medicina preventiva promissora.”
Marcia Riboldi, Diretora da Igenomix Brasil